Pobreza, Moral e CPLP


Pobreza, Moral e a CPLP

Por: Adebayo Vunge

O relatório da Universidade Católica de Angola, UCAN, sobre a situação económica em Angola aponta um indicador seriamente preocupante. Continuamos a viver, a conviver com uma franja significativa da nossa população na pobreza, ou seja, que pouco mais de 60 por cento da população angolana ainda é pobre.
Este não é um número que agrada a quem quer que seja e que tem reflexos na realidade que se vê nas ruas e esquinas de Luanda. No gingar das zungueiras, levando as costas mais um dos seus petizes, no olhar daquele mendigo no 1º de Maio, nas passadas dos ambulantes ou no sacrificio que muitas crianças passam para chegar às escolas que ficam dezenas de quilometros para lá das suas aldeias.
A inversão desta situação faz-se com uma aposta na economia, na geração de empregos, na criação de oportunidades para uma classe empresarial emergente fomentando as PME. É esta, pelo menos, a tónica que se ouve diariamente nas intervenções do Governo.
O mais constrangedor da nossa pobreza, não é a ausência de carne, peixe, leite e arroz em muitas mesas. Estamos num mix de pobreza mental e material. O mais constrangedor, dizia, é que temos assistido a uma séria e grave inversão de valores morais, cujo rosto são alguns dos crimes horripilantes que chegam ao nosso conhecimento sempre por intermédio da media, levando a que os mais papistas que o papa se intriguem com o papel da media.
Na visão de muitas destas pessoas, ao dar-lhes visibilidade mediática, a imprensa está a promover este tipo de comportamentos criminosos. Não é esta seguramente a minha opinião, na medida em que mais do que tudo, o papel da imprensa aqui é informar, havendo outros órgãos e instituições, ou deveriam haver, que cuidam desta matéria.
Um dos sérios problemas com que nos deparamos prende-se com a questão do saneamento básico, com a gritante falta de higiéne patente nos bairros periféricos ou nos locais de venda na cidade. E, é muito mais por isso que nos colocamos contra a venda ambulante e outras práticas comerciais a ceu aberto nas nossas cidades. Olhem o que se passa em frente as maternidades e outros hospitais públicos. Olhem o que se passa em alguns prédios onde as pessoas não se fartam de sujar, de destruir um património que deveriam preservar. Olhem o que fazem os engraxadores. Olhem os miudos ambulantes que agora são fixos em frente a rádio, ao 1º de Maio ou na avenida Deolinda Rodrigues, do qual um automobilista chegou a supor que se tratassem de almas de outro do mundo a quantidade de peões que atravessa aquela avenida a qualquer hora do dia e da noite.
Aqui sim, quanto a mim, a media deveria jogar um papel mais acutilante no sentido da inversão de valores ao invés de promover apenas mediociridades e nivelamento por baixo por trás da capa do entretenimento. Até vou mais longe, quantos programas televisivos, espaços radiofónicos, páginas de jornal se preocupam integralmente com a educação para a cidadania?
Aqui sim, quanto a nós, é chegada a hora de entrarem em cena os chamados assistentes sociais. E quando alguns leitores julgarem que se trata de uma miragem, sugiro que visitem o Instituto Superior de Ciências Relegiosas. Por exemplo, é crivel que muitos populares venham a ser transferidos nos próximos tempos para as novas centralidades de Luanda. Também é consabido que a maioria destes populares não estão preparados para viver em prédios tão altos quanto aqueles. E isso para mim não é pecado. Ninguém nasce sabendo, mas todos temos a chance de aprender e, os educadores sociais, para além da media repito, teriam aqui um papel chave no sentido de esclarecerem as pessoas sobre as melhores práticas naquele novo ambiente habitacional proporcionado pelo Estado. Mas temos de pensar também nos mecanismos sancionatórios como acontece em toda a parte. Da água a energia, passando pelas escolas das crianças ou mesmo pelos custos com a saúde.
2. Nesta semana da cimeira da CPLP em Angola, não gostaria também de estar a margem e por isso dei comigo a reflectir sobre esta matéria no que tange a questão do acordo ortográfico e da livre circulação de pessoas entre os países da comunidade linguistica.
Em relação ao acordo ortográfico confesso que não tenho uma opinião conclusiva. Embora reconheça as vantagens em termos de uniformização, julgo que este acordo está já demasiado politizado (com os países utentes a degladiarem-se entre si) pelo que a sua entrada em vigor será postergada por outras soluções que nem eu mesmo imagino quais serão. Em Angola, de uma maneira geral, as pessoas olham com bastante desconfiança ao documento que já data dos anos 90.
Outra questão que volta e meia entra para a agenda política da comunidade é a livre circulação de pessoas, ou como quem diz, um acordo comunitário de isenção de vistos de curta e média duração. Há já acordos bilaterais entre Angola e Moçambique, entre Angola e Cabo-verde, entre Portugal e Brasil, mas estas iniciativas são residuais e pontuais. Se é verdade que os Estados estão integrados em organizações e blocos regionais com prioridades opostas, não é menos verdade que um acordo geral está dependente principalmente da vontade política dos Estados. Isso sim daria corpo a comunidade.

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