Luanda, a cidade de todos



Luanda celebra hoje, 25 de Abril de 2014 mais um ano de existência desde que Paulo Dias de Novais se encarregou da sua fundação no longínquo 1575.

Uma cidade medieval-renascentista (?) que desde então, sofreu diversas mutações de ordem antropológica, demográfica e arquitecto-urbanística, como vemos no presente. Os limites da cidade foram largamente expandidos e Luanda tornou-se uma verdadeira metrópole africana, ao estilo de Lagos, Naiorobi e Cairo, mas que carece de ordem porque é hora de se travar o grande caos em algumas zonas.

A afirmação do escritor Pepetela, há alguns anos, é bastante elucidativa, quando chamou atenção para a necessidade de se travar-se urgentemente a mussequização da cidade. O trânsito caótico, a desordem urbana principalmente na periferia da cidade onde se constroi tudo anarquicamente, as ausências de água e luz, a venda generalizada são alguns dos traços de Luanda hoje e que precisamos todos combater, com os mais pequenos gestos.

Nada é mais verdadeiro que Luanda consegue conviver com o que há de melhor e, ao mesmo tempo, com o que há de pior. Com os bairros de lata e os condominios XPTO onde o luxo é comparável ao que se pode encontrar numa qualquer outra grande vila na Europa, na Ásia emergente e nos Estados Unidos. Mas como sempre, o problema não é a modernidade, não é o que está bom e bonito. O problema para o qual todos nos devemos debruçar e combater é a elevação do nível de vida dos que estão mal, dentro do espírito definido de combate as assimetrias e melhoria da distribuição da riqueza.

Dos que nasceram em Luanda até aos que nela fazem morada hoje, não é indiferente o encanto, a beleza e o fascinios que a cidade gera. Por isso, acima de tudo, a questão de Luanda passa pelas instituições que devem ser fortes e pelas pessoas.

Ao olharmos para as novas centralidades, para a requalificação de bairros como Sambizanga temos de regozijar-nos e esperar que o mesmo seja feito no Prenda, Catambor, Rocha Pinto, Marçal ou ainda os novos bairros que nasceram como fruto do contexto de guerra que interferiu grandemente na geografia e demografia da cidade. Por isso mesmo, Luanda é a cidade de todos.

LUANDA está aqui no poema de Luandino Vieira CANÇÃO PARA LUANDA

A pergunta no ar
no mar
na boca de todos nós:
– Luanda onde está?
Silêncio nas ruas
Silêncio nas bocas
Silêncio nos olhos

– Xê
mana Rosa peixeira

– Mano
Não pode responder
tem de vender
correr a cidade
se quer comer!

“Ola almoço, ola amoçoéé
matona calapau
ji ferrera ji ferrerééé”
 – E você
mana Maria quitandeira
vendendo maboque
os seios-maboque
gritando
saltando
os pés percorrendo
caminhos vermelhos
de todos os dias?
 “maboque m’boquinha boa
dóce dócinha”

– Mano
não pode responder
o tempo é pequeno
para vender!

Zefa mulata
o corpo vendido
batom nos lábios
os brincos de lata
sorri
abrindo seu corpo

– seu corpo-cubata!
Seu corpo vendido
viajado
de noite e de dia.
    – Luanda onde está?

Mana Zefa mulata
o corpo cubata
os brincos de lata
vai-se deitar
com quem lhe pagar
– precisa comer!

– Mano dos jornais
Luanda onde está?
As casas antigas
o barro vermelho
as nossas cantigas
trator derrubou?

Meninos nas ruas
caçambulas
quigosas
brincadeiras minhas e tuas
asfalto matou?
– Manos
Rosa peixeira

quitandeira Maria
você também
Zefa mulata
dos brincos de lata
                       – Luanda onde está?

Sorrindo
as quindas no chão
laranjas e peixe
maboque docinho
a esperança nos olhos
a certeza nas mãos
mana Rosa peixeira

quitandeira Maria
Zefa mulata
– os panos pintados
garridos
caídos
mostraram o coração.
                         – Luanda está aqui!

(1957)


E para aqueles que vivem com saudades de Luanda, vai esta canção de Paulo Flores: http://www.youtube.com/watch?v=oyVNaJIJmTY

Afinal, repito, Luanda é de todos.


ADEBAYO VUNGE

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