IMPRESSÕES DIGITAIS Comparticipação dos cidadãos nos serviços públicos

Adebayo Vunge (*)

A maioria de nós concorda, a priori, quanto à necessidade de procurarmos fontes alternativas ao financiamento dos serviços sociais públicos, todavia teimamos em aceitar a hipótese de haver uma comparticipação dos cidadãos nestes processos. Os números fazem-nos crer que esta direcção é incontornável e podemos apenas estar aqui com o discurso politicamente correcto, falinhas mansas para alguns e demagogia para outros. Em rigor, apenas estaremos a adiar esta opção que move inclusive outros países bastante mais desenvolvidos que nós.

Do meu ponto de vista, vivemos alguns problemas da transição do ciclo político, económico e social. É um novo contrato social onde, sem abandonarmos o Estado Social, este é chamado a desempenhar o seu papel de agente regulador e força motriz para alavancar o desenvolvimento, mas definitivamente não poderá atingir este objectivo de modo isolado.

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A discussão franca destes postulados, nunca foi mais necessária do que actualmente pois todos sabemos que é hora de apertarmos o cinto, de consentirmos sacrifícios em nome de um bem colectivo. Do muito que foi feito no período pós-guerra, o sector social – educação, saúde, protecção social dos desfavorecidos, etc. – constitui aquele onde notamos as maiores lacunas, agravadas com o facto de incidirem de modo directo na qualidade de vida das pessoas.

Não é uma questão meramente financeira. Mesmo que percentualmente no OGE o valor seja baixo, numericamente não era um valor desprezível. Foi por isso uma questão de opções e de políticas públicas ineficientes com metas igualmente pouco conhecidas, confirmando elevado desperdício de fundos públicos e doações. O crescimento da despesa de saúde não foi necessariamente acompanhada de resultados. Exceptuando-se a contenção da propagação do HIV, os números da saúde continuam a ser desoladores e todos sabemos do que falo.

Não podemos mais nos permitir ver crianças a morrerem antes dos 5 anos de idade por falta de oxigénio, partorientas a partilharem uma cama ou um rácio abismal de médicos por cidadãos. É urgente melhorar.

A necessidade de haver um continuo debate nacional sobre a comparticipação progressiva onde quem pode mais contribui mais é igualmente urgente e pertinente no contexto actual pois os períodos de crise propiciam, na sociedade e nas instituições, abertura à mudança, ainda mais num cenário em que se assiste uma redução de recursos públicos para atender as necessidades sociais que se agudizam.

Esta fase coloca a nu as vulnerabilidades social e económica de vários segmentos da população. Obviamente que diante de um cenário destes, o padrão de comportamentos de saúde e de prevenção da doença tende a deteriorar-se e, por isso, notamos desde 2015, um aumento de casos de várias patologias. Mas este é paradoxalmente o contexto mais favorável para que todos possamos ponderar um modelo de comparticipação social nos serviços públicos, em especial da saúde e da educação. Um modelo que pode ser inspirado em casos internacionais de sucesso, implementado com o apoio de organizações internacionais com expertise e favorecidas por uma gestão amplamente transparente.

Falamos da saúde que é, do meu ponto de vista, mais delicado e complexo, mas poderíamos assinalar também a educação de que destacaria o programa merenda escolar. É claro que aqueles extractos da população mais carenciados ou com deficiência física, idosos, entre outros podem beneficiar de isenções ou descontos, mas, de uma maneira geral, no médio longo prazo é importante que se pondere os prós e contras de tal opção de comparticipação. Isto é também cidadania.


(*) Jornalista e director do GCII do Ministério das Finanças
Assina todas as terças-feiras no Jornal de Angola e a sua opinião não vincula o Ministério das Finanças.


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