Privatizar em novos moldes (Iª parte)




Adebayo Vunge (*)

Tem-se falado com regularidade sobre o (re)início do processo de privatizações. Não sendo matéria recente, a curiosidade dos meios de comunicação reside apenas para o nome das empresas, mas chamo aqui atenção para outros aspectos como, desde logo o o modelo a ser utilizado por Luanda, nomeadamente: alienação absoluta (privatizar), concessão (delegações para a prestação de determinadas tarefas) ou utilizar esta oportunidade para o estabelecimento de Parcerias Público-Privadas (acordos entre o Estado e a iniciativa privada para a construção e gestão de infra-estruturas, equipamentos ou serviços).

No caso das Parcerias Público-Privadas, o Estado permanece proprietário do bem que assim é público, remunerando o contratado de modo a que este preste determinado serviço ou forneça bens. Há assim uma partilha dos riscos, tal como dos lucros e prejuízos. A duração destas parcerias oscila, na maioria dos casos, entre um mínimo de 5 e um máximo de 35 anos. Em sede das privatizações ou de outros equipamentos como o desenvolvimento de um metropolitano urbano em Luanda poderia seguir esta opção.

As Concessões não transferem a propriedade detida pelo Estado para o particular, mas obrigam o estabelecimento de um contrato entre a parte pública e o ente privado para oferta de determinado bem e/ou prestação de serviço. A semelhança da modalidade das PPP, Estado e privados firmam acordos de benefício mútuo e entreajuda. A natureza contratual é variável, atingindo máximos de 99 anos de entrega.

Por último, as privatizações em strictu sensu, consubstanciam-se na alienação do bem público que uma vez entregue ao privado, este usufrui dos lucros e prejuízos de forma isolada.

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Na história económica recente de Angola, assistimos a dois fenómenos contíguos. Por um lado os confiscos/nacionalizações durante a época de economia centralizada assente na propriedade do Estado sobre os meios de produção e num Partido Único, que buscava recuperar a dinâmica empresarial anterior a independência. Tal miragem, assente na elevada produção agrícola e industrial de 1973 ignora o contexto colonial, de exploração da mão-de-obra por quase inexistência de direitos laborais.

O ponto decisivo foi a Lei das Nacionalizações e Confiscos (Lei nº 3/76) e os Estatutos das Unidades Económicas Estatais (UEE) na Lei nº 17/77, de 15 de Setembro que passou a regular a actividade das empresas do Estado. Assim, em 1990, 79% do total das grandes empresas e 67% do total das médias empresas eram públicas. De igual forma, 78% da capacidade industrial pertencia ao Estado.
Isto contrastava com a realidade colonial, onde em 1972, a indústria transformadora representava 25% do PIB e a participação do Estado tinha uma composição reduzida, com menos de 30% no sector industrial.

O Estado angolano confiscou inúmero património empresarial, mas também fez nascer novos empreendimentos, completamente novos, em diversos sectores da economia: dos transportes a hotelaria, da agricultura à indústria. O Estado era dono de tudo! Dois exemplos desse movimento são os casos da Sonangol (nascimento de uma empresa pública assente na lógica líbia da NOC (National Oil Corporation) e da Endiama (após o confisco da Diamang). Depois, fundamentalmente com a abertura para a economia de mercado que se ensaiou desde o SEF (inciado com uma directiva do IIº Congresso do MPLA em 1985 e materializado nas linhas do programa em 1987), assistimos dois processos de privatizações.

Ao transferir os seus activos para os operadores privados, Angola procura fundamentalmente dois objectivos:

- Em primeiro lugar, tornar essas empresas mais eficientes e mais competitivas no mercado, uma vez que, no nosso caso, o seu potencial comercial encontra-se adormecido tendo os seus gestores um forte apetite apenas para os subsídios e outras transferências do Estado.

- Em segundo lugar, encaixar dividendos com este género de operações. E notamos isso quando olhamos para os números dos processos anteriores: em 2000, foram privatizadas cerca de 409 empresas (UEE) e o Estado arrecadou cerca de cem milhões de dólares. No processo seguinte, entre 2001 e 2009, foram privatizadas 52 empresas e o Estado arrecadou 132 milhões de dólares.

Independentemente do tipo de empresas, um dos aspectos inovadores do actual processo de privatizações que tem vindo a ser desenhado pelo Executivo é o seu grau de transparência, com a intenção de realizar grande parte destas operações na Bolsa de Valores (BODIVA). Não apenas o mercado de capitais dará um salto e evoluirá no seu estágio de maturidade, entrando em evidência o segmento das acções corporativas, mas principalmente porque o processo seguirá um modelo de privatizações que respeita a competitividade e a concorrência com ganhos maiores para Angola.

É importante, todavia, termos em atenção que há prós e contra às privatizações. Não é, por si só, o facto de as empresas passarem para a esfera privada que melhores resultados serão obtidos, sejam financeiros, como de gestão. Quando analisamos muitas das empresas privatizadas em processos anteriores notamos esta realidade.

Com isso, a discussão é: privatizar realmente confere bons resultados para o País? Ou o Estado deveria manter o controle em áreas estratégicas da economia como os serviços de água, luz, petróleos, mineração, banca entre outros, de forma absoluta ou em parceria (PPPs)?

(*) Director do GCII MINFIN. A sua opinião não vincula o Ministério das Finanças.


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